Carlos Batinga Chaves (*)

A proposta de “tarifa zero” da forma que vem sendo defendida pelos movimentos  sociais, merece uma profunda reflexão sobre sua viabilidade.

 

Independente do questionamento sobre o lucro dos empresários, a qualidade dos  veículos ou o comportamento dos operadores, o serviço tem um custo que  precisa ser bancado por alguma fonte. Os 5,5 empregados necessários por  ônibus em operação, precisam receber seus salários. O combustível,  lubrificantes, pneus, peças e acessórios precisam ser pagos, sem falar nos  próprios veículos, onde o mais simples custa próximo dos R$ 300.000,00.   Assim, para que a discussão sobre “tarifa zero” prospere é preciso definir quem vai pagar a conta, como o beneficio vai ser controlado e quem se  habilita a operar este serviço na instabilidade regulatória reinante no  País , pois o governo não tem a menor competência para assumir diretamente,  fato já plenamente comprovado em tentativas passadas e atualmente agravada  pela crise de gestão que atravessa o governo em praticamente todas as áreas.
A luta por um transporte público de qualidade, onde seu custo não seja  assumido apenas pelo usuário, tem sido uma bandeira histórica da ANTP, Fórum  dos Secretários, Frente dos Prefeitos e MDT, dentre outras instituições, que  em suas propostas apresentam as fontes externas de financiamento, dentre eles  uma taxação sobre o licenciamento e o combustível utilizado pelo transporte  privado.   Muitas frentes de discussão podem ser abertas sobre este tema, a exemplo do  passe livre para estudantes de escola pública, cujo projeto de autoria do  senador Renan Calheiros e em tramitação no Congresso, define como fonte de  recursos os royalties do petróleo e podem beneficiar até 20% dos usuários do  transporte coletivo urbano. O vale transporte que é responsável por uma média  de 40% dos deslocamentos de quem utiliza este serviço e é custeado em parte  pelo trabalhador, pode ser assumido integralmente pelo empregador, assim  computando apenas estas duas categorias, já teríamos passe livre ou “tarifa  zero”, como queiram chamar, para 60% dos passageiros.

O clamor das ruas pelo barateamento das passagens, tem deixado de fora um  item que onera consideravelmente o transporte público, que é o privilegio de  que gozam alguns segmentos de usuários, a exemplo dos policiais, fiscais de  vários serviços públicos e da justiça, carteiros, idosos e pessoas com  deficiência, que na maioria das cidades ultrapassam o índice de 20% dos  passageiros transportados. Se essas benesses forem custeadas pelas  instituições e entidades que as concederam, somados ao vale transporte e a estudante, já estariam sendo beneficiados pela “tarifa zero” mais de 80% dos  usuários, sem a necessidade de defender propostas inviáveis econômica e  operacionalmente que têm cercado este debate.
Porém, para se pensar em uma forma de implementar qualquer destas idéias,  são necessários mecanismos de planejamento, controle e avaliação, o que só é  possível com a estruturação dos órgãos locais de gerência, que ao longo dos  últimos 20 anos foram desmontados, ao ponto de atualmente não terem  capacidade de elaborar os projetos necessários para captar os  recursos  disponibilizados nos PACs da Mobilidade.   Implantar a “tarifa zero” certamente aumentará a demanda, que na atual
situação do transporte urbano também ampliará sua ineficiência, logo em  nada contribuirá para melhorar a qualidade de vida em nossas cidades, pois  antes de mais nada, precisamos de uma gestão competente da mobilidade a nível  local.

(*) Carlos Batinga Chaves é Engenheiro Especialista em Transportes Urbanos e  Membro do Conselho da ANTP


		
			

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